1. A Questão da Gestão Urbana
A grande maioria as cidades brasileiras apresenta um
crescimento significativo, resultado do processo de urbanização que vem
ocorrendo no País nas últimas cinco décadas. O crescimento acelerado das
cidades brasileiras e a multiplicação dos problemas de seu espaço físico são
evidentes.
Em todas elas, comparecem problemas que foram se sedimentando em função, tanto da falta de recursos, quanto da falta de processos racionais para direcionar o desenvolvimento do espaço urbano para objetivos de bem estar e qualidade de vida das populações.
Os processos de assentamentos periféricos estão fora de controle. As dificuldades na extensão dos sistemas de saneamento básico e demais infraestruturas, acrescentam às cidades, grandes áreas com alto potencial de deterioração ambiental. A qualidade de vida resta como privilégio de uma minoria.
Os desastres motivados pelos desmoronamentos de encostas ocupadas por moradias precárias é o mais recente alerta sobre a questão das ocupações inadequadas do solo urbano. As tragédias urbanas se repetem, penalizando quase sempre as populações pobres ou marginalizadas.
As dificuldades em resolver os problemas crescem, principalmente pela falta de recursos suficientes para acompanhar o crescimento populacional com a produção de um espaço urbano adequado. Tal fator se agrava ainda mais pelas deficiências no desempenho técnico e gerencial, presentes nos processos das administrações municipais.
Este desafio, portanto, demanda processos de tratamento que objetivem e alcancem resultados eficazes, a curto prazo e com economias significativas dos recursos disponíveis.
A eficácia no desempenho gerencial, por sua vez, é função dos recursos instrumentais e dos níveis de capacitação das equipes técnicas, em cada prefeitura municipal.
A população e as atividades urbanas necessitam de espaço
adequado para seu desempenho. Seu assentamento deve atender à condições
técnicas e urbanísticas que lhe garantam
segurança e
sustentabilidade ambiental.
Em cada localidade, os espaços de uso permitido e aqueles impedidos de uso tem que ser tecnicamente identificados e seu tratamento deve ser planejado em função de uma racionalidade, que contemple o equilíbrio ecológico e a qualidade de vida das populações.
Esta é a função e a responsabilidade de cada prefeitura municipal que entretanto, deverá estar apta para desempenhá-la.
Admite-se que uma parte
substancial dos problemas do quadro urbano possa ser minimizada por meio de uma
gestão qualificada do uso e ocupação do solo, atentando para três aspectos:
- implantação de processos de gestão planejada do uso do
solo;
- presença de quadros
técnicos locais bem preparados;
- integração das
comunidades locais nos processos de planejamento do uso e ocupação do
solo.
O engajamento das comunidades locais no processo decisório sobre o uso e ocupação do solo, somente será realizado se elas e seus representantes legais forem participantes do seu planejamento e de seu monitoramento.
2. O papel do Planejamento
Planejamento urbano é uma ação prática e política sobre o processo de produção do espaço, com o objetivo de transforma-lo. Tais objetivos, portanto devem estar claros.
Planejar é utilizar um determinado processo de racionalização do uso de meios, instrumentos e agentes para consecução dos objetivos. Tecnicamente isso significa dizer o que fazer e como fazer, com que prioridades e com que recursos.
O processo de planejamento urbano consiste, sumariamente, em conhecer o espaço atual da cidade e, por meio desse conhecimento, estabelecer as intervenções necessárias para mudar sua configuração e sua evolução naquilo que se demonstrar necessário para sua correção.
A resolução e a forma de tratar os problemas do espaço físico de cada núcleo urbano, otimizando os recursos existentes e acionando os recursos potenciais é, pois, uma questão de método, no nível do planejamento urbano local..
É uma questão de método porque otimizar recursos implica em errar menos, portanto em ter eficácia na consecução de determinados objetivos. Implica também em obter resultados em prazos mínimos, dada a velocidade dos processos do desenvolvimento urbano e o volume e a gravidade dos problemas acumulados.
O processo de monitoramento é parte integrante do planejamento. Ele acompanha e qualifica a implementação das diretrizes dadas ao desenvolvimento urbano local, procedendo sua avaliação e correção e atualizando constantemente o conhecimento dos fenômenos.
Seu objeto é o meio ambiente urbano problematizado e seu objetivo geral é a melhoria e a democratização da qualidade de vida urbana e a preservação do meio ambiente, em seus elementos e relações.
Sua eficácia é medida pelos padrões dos resultados
ambientais, pela economia e rapidez em sua obtenção e pela qualidade de vida
gerada.
3. O objeto do Planejamento
O espaço das cidades em crescimento é sempre um espaço em expansão periférica e em transformação interna. Ambas se realizam pela construção e reconstrução de habitações, edifícios públicos, ruas, redes de distribuição de água e energia elétrica, etc.
Este crescimento depende e
se faz por meio de um processo específico de produção e de reprodução dos
espaços, cujos meios são os recursos financeiros, as tecnologias disponíveis,
os materiais de construção, o solo urbano e o solo rural do entorno de cada
cidade.
Este processo é, em parte acionado pelo Poder Público e, em parte, pelas entidades privadas, inclusive as familiares.
Quando a administração de uma cidade se propõe a intervir nesse processo, necessita estabelecer um conhecimento da evolução da mesma e de suas perspectivas, que lhe permita explicar os fenômenos expressos nos problemas presentes e, assim, poder prever suas reais tendências.
A participação popular garante, também a sustentabilidade das propostas geradas no processo de planejamento.
Essa estratégia de participação no processo de planejamento confere, além da racionalidade técnica, a transparência política e a contribuição do saber popular. Garante e objetiva a pressão das comunidades e sua fiscalização sobre os processos legislativos e executivos locais. Somente por esse meio, ele tem garantida sua sustentabilidade. (política, técnica, temporal e espacial)
A participação popular não deve ser entendida apenas pela divulgação ou pelas consultas formais sobre projetos e planos acabados mas, sim, como um processo partilhado de decisões progressivas que vão desde a formulação das questões locais até as propostas de ação e as posteriores ações de monitoramento
O processo decisório comprometido com a qualidade de vida da comunidade local é obtido por meio e durante a elaboração participativa (técnicos e população) dos diagnósticos e das propostas sobre as questões locais.
A elaboração participativa de instrumentos normativos, na forma de Planos Diretores, compostos por um conjunto coerente de estratégias, normas e programas para o melhor uso e ocupação do solo urbano, integra os agentes e as ações de intervenção.
Este processo demanda um método e instrumentos de trabalho
que lhe assegurem a correção e a eficácia necessárias.
- ser uma peça do sistema
administrativo local plenamente realista, enquanto sua viabilidade face aos
recursos materiais, humanos, jurídico-legais, técnicos e administrativos
disponíveis ou potencias da cidade;
- ser uma proposta inicial que
abrange os problemas atuais da cidade e suas tendências previsíveis, a curto e
médio prazos;
- ter sua avaliação/revisão
permanente (processo de monitoramento, é melhor:defini-lo aqui) garantida por
instrumentos complementares de avaliação e revisão, (só assim ele compreenderá,
será um instrumento do sistema de planejamento local;
- obter condições políticas
favoráveis a sua real implementação prática. Nesse sentido, ele deverá ser
elaborado pela equipe técnica da prefeitura local e o processo decisório local
deverá acompanha-lo em todas as suas etapas de elaboração.
O processo de elaboração do plano Diretor e, posteriormente, os processos de sua avaliação e adaptação devem ser ágeis e rápidos (para não se tornarem obsoletos) o que demanda uma metodologia que atenda a esta exigência, sem prejuízo de sua eficácia e correção.
Mas, o que é um Plano Diretor? Quais são seus objetivos específicos? Como se apresenta um Plano Diretor e, principalmente, como ele se garante como instrumento eficaz da implantação e manutenção de uma política local de desenvolvimento.
Se tal instrumento não for claramente definido e explicitado, é possível cair no domínio de uma prática sem regras e sem limites, no predomínio do empirismo e da aleatoriedade.
Segundo H. Lopes Meirelles. o Plano Diretor “é a lei suprema e geral que estabelece as prioridades nas realizações do governo local, conduz e coordena o crescimento da cidade, disciplina e controla as atividades urbanas, em benefício do bem estar social”.
Ele deve ser capaz de servir como instrumento de controle das modificações contínuas do espaço urbano, ao mesmo tempo que enfrenta seus problemas e suas tendências não desejadas.
Sua elaboração e seu processo de implementação tem que estar garantidos, simultaneamente, por procedimentos metodológicos e técnicos adequados e por um processo político (decisório) real.
Assim, há duas preocupações a enfrentar:
- dizer o que deve conter um Plano Diretor ;
- ditar como se deve elaborar um Plano Diretor.
O Plano Diretor tem, na prática três vertentes simultâneas:
- os problemas da cidade, na figura das
deficiências e dificuldades no uso e ocupação do espaço e/ou na prestação dos
seus serviços;
- as características do espaço urbano atual e de
suas tendências de expansão e transformação;
- os objetivos ou os resultados esperados pelos
usuários para a superação de seus problemas.
Ele apresentará tanto propostas para regulamentar a renovação dos espaços e as construções de prédios, quanto indicará como acrescentar novos terrenos à cidade ou como utilizar os que permanecem vagos; orientará e regulamentará a produção e o uso dos serviços urbanos de saneamento e de transporte; prescreverá como controlar a renovação, os usos, a conservação e a preservação dos espaços já construídos, dos monumentos históricos e das reservas naturais de interesse ecológico.
O Plano Diretor se compõe, formalmente, de diretrizes para o desenvolvimento da estrutura espacial global da cidade; de sua norma urbanística; dos planos e programas setoriais referentes àquele desenvolvimento; dos instrumentos de sua implementação
O Plano Diretor trata da cidade como um todo integrado formado por um espaço habitado que tem problemas, defeitos e finalidades.
Ele tem que ser realista, justo e eficiente, isto é, deve tratar os problemas concretos da cidade dentro das viabilidades reais; deve garantir que os recursos e as facilidades urbanas sejam distribuídos com justiça e segundo prioridades abertamente discutidas; deve prever a melhor qualidade de espaços, equipamentos e infraestruturas, com a maior economia.
O Plano Diretor tem que ser flexível. Ele encaminha, dirige uma evolução determinada, portanto terá que ser avaliado e revisado constantemente, em sua função de instrumento regulador e auxiliar da garantia da qualidade urbana local.
Ele deve estar integrado de forma dinâmica e plena na administração da cidade, principalmente por meio de orçamento municipal, onde os planos e projetos se materializam.
A natureza de instrumento de controle dada ao Plano Diretor
leva a exigência de que:
- sua elaboração seja realizada na cidade para a
qual se destina;
- os técnicos em planejamento urbano, da
prefeitura municipal sejam, obrigatoriamente participantes dessa elaboração;
- os representantes da comunidade local tenham voz
e voto nas etapas decisórias do processo de elaboração do plano, incluída a
aprovação de sua versão final.
O Plano Diretor Urbano compreende uma proposta abrangente
para a organização e o controle do desenvolvimento do espaço urbano e de seus
serviços, atendendo a determinados objetivos das políticas urbana e ambiental
de cada localidade. Ela atenderá as diretrizes da Constituição Federal, a
legislação ambiental pertinente e a Lei Federal 10.257/2001 – Estatuto de
Cidade.
Seus conteúdos serão elaborados, objetivando permitir e instrumentar o Poder Público Local para:
- induzir o processo de urbanização, de modo a
obter estruturas urbanas operáveis a custos adequados;
- gerenciar a boa localização dos equipamentos
coletivos;
- controlar o parcelamento do solo e sua ocupação
por edificações;
- estabelecer as formas e os limites da expansão
urbana;
- preservar áreas de valor cultural e artístico;
- definir as incompatibilidades de vizinhança;
- manter a relação ótima entre a densidade de
ocupação, as infraestruturas e os serviços urbanos;
- adequar o sistema viário ao processo de
desenvolvimento urbano e rural;
- evitar problemas ambientais decorrentes dos
processos urbanos;
- estabelecer metas e programas de ação
governamental.
A apresentação do ante-projeto do Plano Diretor Urbano,
deverá estar acompanhada de uma Memória Técnica, descritiva de seu processo de
elaboração, apresentando todos os sub-produtos gerados .
O conteúdo da Lei do Plano Diretor deverá se desenvolver nos seguintes capítulos principais:
- Princípios e objetivos da política urbana do
Município.
- Diretrizes para o desenvolvimento ambiental e
urbano.
- Zoneamento e setorização dos espaços urbano e de
expansão urbana.
- Estrutura básica da distribuição dos espaços
verdes e dos equipamentos de consumo coletivo.
- Hierarquização e normatização do sistema viário.
- Condicionantes urbanísticos das edificações.
- Normas para o parcelamento do solo.
- Meios e formas de implantação do processo de
monitoramento da implementação do Plano Diretor.
- Anexos, contendo as descrições das poligonais da
área urbana e das respectivas zonas e setores; mapas do zoneamento e do sistema
viário, desenhos e tabelas auxiliares.